sábado, 3 de setembro de 2011

Esboço de Velharias

  Começarei a partir de hoje a repostagem de escritos antigos. Na verdade, eles foram concebidos em tempos remotos nos quais eu ainda sabia (o que era) escrever. Escrevinhar, ao menos. Hoje, fiquei muda.

  É em nome de toda essa saudade que não me abandona que viajo os textos do Recanto das Letras para o Blog. O sentimento de perda e eteriedade do meu "duplo" literário jamais cessarão. E as negativas em torno de toda e qualquer palavra minha permanecem.

  Antes do querido Dentro do espelho, vai um dos trechos mais lindos que já ousei ler em minha vida. Assim como o de minha autoria numa fase remota, este traz à superfície todo o subjacente do meu coração atual. Coração mutante, coração pirata.

  "Faz muitos anos que isso aconteceu. A parede da escada, onde vi subir o reflexo de sua vela, há muito já não existe. Em mim, tantas coisas foram destruídas, coisas que eu julgava fossem durar para sempre, e se construíram novas, dando origem a penas e alegrias novas que eu não teria podido prever então, assim como as antigas se tornaram difíceis de compreender. Também há muito tempo meu pai deixou de poder dizer a mamãe: "Vai com o menino." A possibilidade de semelhantes horas nunca renascerá para mim. Porém, desde algum tempo, recomeço a perceber muito bem, se apuro os ouvidos, os soluços que então consegui conter na presença de meu pai, e que só rebentaram quando fiquei a sós com mamãe. Na verdade, eles nunca cessaram, e é somente porque a vida se vai agora emudecendo cada vez mais a meu redor que os ouço de novo, como os sinos do convento que parecem tão silenciosos durante o dia por causa dos barulhos da cidade que os julgamos parados, mas que voltam a soar no silêncio da noite."

(Proust, No caminho de Swann)

Nenhum comentário:

Postar um comentário