segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Camuflando a dor com goles de cafeé

Sinto uma leve agonia
inflar no peito
Daquelas que não se
sabe direito
ondé que vai dar

Já tentei uma lâmina,
gilete,
no pulso, quem sabe
Já pensei noutra pátria,
uma viagem
pelo mundo, oxalá

De todas as dores,
flamejantes e contidas,
que se carrega
pela vida,
me deixa aqui ao menos
as pequenas turbações
do dia, quiçá

Espero que morramos,
que eu me consuma,
que me venham as varizes,
que a carne tenra se torne dura,
sem esperar desta vida
a mais breve esperança

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Entre as folhas do verde O


"O príncipe acordou contente. Era dia de caçada. Os cachorros latiam no pátio do castelo.

Lá embaixo parecia uma festa. Brilhavam os dentes abertos em risadas, as armas, as trompas que deram o sinal de partida.

Na floresta também ouviram a trompa e o alarido. E cada um se escondeu como pôde.

Só a moça não se escondeu. Acordou com o som da tropa, e estava debruçada no regato quando os caçadores chegaram.

Foi assim que o príncipe a viu. Metade mulher, metade corça, bebendo no regato. A mulher tão linda. A corça tão ágil. A mulher ele queria amar, a corça ele queria matar. Se chegasse perto será que ela fugia? Mexeu num galho, ela levantou a cabeça ouvindo. Então o príncipe botou a flecha no arco, retesou a corda, atirou bem na pata direita. E quando a corça-mulher dobrou os joelhos tentando arrancar a flecha, ele correu e a segurou, chamando homens e cães.

Levaram a corça para o castelo. Veio o médico, trataram do ferimento. Puseram a corça num quarto de porta trancada.

Todos os dias o príncipe ia visitá-la. Só ele tinha a chave. E cada vez se apaixonava mais. Mas corça-mulher só falava a língua da floresta e o príncipe só sabia ouvir a língua do palácio.

Então ficavam horas se olhando calados, com tanta coisa para dizer.

Ele queria dizer que a amava tanto, que queria casar com ela e tê-la para sempre no castelo, que a cobriria de roupas e jóias, que chamaria o melhor feiticeiro do reino para fazê-la virar toda mulher.

Ela queria dizer que o amava tanto, que queria casar com ele e levá-lo para a floresta, que lhe ensinaria a gostar dos pássaros e das flores e que pediria à Rainha das Corças para dar-lhe quatro patas ágeis e um belo pêlo castanho.

Mas o príncipe tinha a chave da porta. E ela não tinha o segredo da palavra.

(...) E no dia em que a primeira lágrima rolou dos olhos dela, o príncipe pensou ter entendido e mandou chamar o feiticeiro.

Quando a corça acordou, já não era mais corça. Duas pernas só e compridas, um corpo branco. Tentou levantar, não conseguiu. O príncipe lhe deu a mão. Vieram as costureiras e a cobriram de roupas. Vieram os joalheiros e a cobriram de jóias. (...) Só não tinha a palavra. E o desejo de ser mulher.

Sete dias ela levou para aprender sete passos. E na manhã do oitavo dia, quando acordou e viu a porta aberta, juntou sete passos e mais sete, atravessou o corredor, desceu a escada, cruzou o pátio e correu para a floresta à procura da sua Rainha.

O sol ainda brilhava quando a corça saiu da floresta, só corça, não mais mulher. E se pôs a pastar sob as janelas do palácio. "


 Tive vontade de escolher uma predileção minha para o Blog. Veio, vagarosamente, a minha cabeça o conto que acima está. É de autoria de Marina Colasanti. Não conheço profundamente o trabalho dela, mas o que conheço – que é muito pouco - já me fascina.
  O amor entre a corça-mulher e o príncipe é mais comum do que se imagina. Basta pensar em todas as incongruências que, por mais amor que haja, nos afastam fatalmente pela vida. Pra nunca mais. É complicado ponderar duas vontades opostas dentro de um mesmo coração. Qual sonho será maior? Ficando, perderemos a viagem. Indo, perderemos a estada.
  Mais que isso. A corça-mulher não domina a língua do castelo. O príncipe não sabe decifrar os sinais da floresta. O cabal residindo na palavra. E mesmo que corça-mulher e príncipe conseguissem se comunicar, não há nada mais próximo e mais distante do coração do que a simplicidade da palavra. A palavra é sempre quadro de um filme que acabou de terminar. Ela está entre.
  Às vezes o amor que sentimos, apesar de forte, nos causa tanto espanto e sofrimento, que, de 7 em 7 passos, os passos da perfeição, o ser amante e amado nos dá a chave que tem em suas mãos. Daí então é fato... a borboleta foge para tornar a ser só casulo. Nada mais.

Ipso iure ou A moralidade disfarçada


  Li recentemente uma reportagem na revista Época. A jornalista abordava as conclusões de uma pesquisa feita por um instituto de pesquisa, segundo ela, especializado em comportamento e tendências no universo feminino. Eu fico até surpresa com a existência de uma empresa que pesquisa sobre as mulheres. É muito interessante conhecer o que vem mudando na cabeça das pessoas em matéria de relacionamento amoroso, carreira, filhos, sexo. O mundo mudou, mas, reflita, nem tanto assim, não é?
  Estas minhas leituras se uniram assim de forma quase cabalística. Fico ainda abismada com as sensações de mundo, de conformidade, de constância. Depois que descobri que até mesmo as línguas seguem um padrão comum, aquilo que, nas palavras de Mattoso, se chama invariabilidade profunda. Sim, é lindo!
  A pesquisa exposta por Época -para quem tiver paciência e curiosidade, está na página 67 da edição com Serra na capa – revelou (?) muito sobre o comportamento da geração de mulheres com 20 e poucos anos. As moças estão se casando mais tarde, ficam mais tempo na casa dos pais depois de formadas no ensino superior, torram o salário principalmente com educação, lazer (destaque para viagens e baladas) e cuidados pessoais. Não parece óbvio? Parece o perfil da mulher do futuro, das men hunters. Daí vem o sensível da mudança. Mesmo dotadas de tanta independência financeira, quase a totalidade das entrevistadas desejam se casar no religioso e no civil. Apenas 28% delas assumem que praticam sexo casual. Tradicionalíssimo.
  Outra observação também faz parte do que me motivou a escrever. Li, faz mais ou menos uma hora e meia, uma coluna no site Yahoo!. A colunista é Sandra Maia e o título, Vale a pena fazer o ‘teste drive’? Não é de carro. Segundo a chamada, dá pra fazer teste drive em gente. É?
  Bom, a colunista abordou a questão do casamento que, oficialmente, não é casamento, mas que, na prática, é casamento. Embolou? Você não é o único. Ela opinou, titubeando, que os casais que moram juntos ou partilham experiências do casamento mesmo que morem separados, deveriam apresentar o parceiro como marido ou mulher. Em suma, que parem com a ‘hipocrisia’ de se julgarem namorados. O texto ficou meio ambíguo, parece que a Sandra não quis colocar a mão no vespeiro. Ou pode ser que a duplicidade de posicionamentos seja condição sine qua non para eriçar os leitores debatentes.
  Vou colocar abaixo alguns tópicos dos participantes. Veja o absurdo! Sinta-se à vontade para concordar ou discordar. A título de curiosidade:


Felipe Queiroz Dias Rocha 07.09.2010
Peraí! Isso não é casamento, não!
Morar junto é uma coisa (se amigar), se casar é outra (estar oficialmente vinculado com a outra parte e ter assumido tal pessoal no civil, e – em alguns casos – no religioso).
Essa questão de morar junto e se casar é plenamente subjetiva, depende de valores e concepções de vida.
Mas não definiria o que a autora definiu como casamento, pois o considero algo mais sério e formal do que o descrito

Denise L. R. 07.09.2010
Respeito todas as opiniões, porém a minha é a seguinte: Esse negócio de test-drive (morar junto) é mais ou menos assim, vou te usar um pouco, caso não goste te meto um pé na B…
Eu não concordo c/ isso !!!!

Wagner Teles 07.09.2010
Todos os pontos de vista são cabiveis.
Depende da situação e interpretação de cada um.
Vale ressaltar que requer maturidade, lealdade e comprometimento independente da decisão.
Pois o fato de o periodo incial ser um mar de rosas ou vice e versa não nos da a garatia de nada.

  O que eu quero dizer com tudo isso é que venho observando, tal qual um lagarto, que, se por um lado a sociedade contemporânea avança com relação à liberdade, à igualdade de direitos e deveres, à justiça; por outro lado, o conservadorismo está para quem quer ver. Perda de tempo permanecer enxergando que o Brasil se tornou um país altamente liberal, moderno, a frente de seu tempo, quando, no bem da verdade, tudo não passa de uma questão de opinião, já dizia a Pitty.
  O moderno não é bom e o conservador, um atraso. Qualquer afirmação que se faça nesse sentido é efêmera e desleal à realidade. O que acontece, na minha fraca visão, é uma mescla de comportamentos sociais.
  A sociedade brasileira dá passos largos quando o assunto é independência financeira, busca de projetos e objetividade, mas retrocede ao estabelecer parâmetros de outro mundo para assuntos tão pessoais como o relacionamento a dois.
  Respeito a orientação e a posição do Felipe e da Denise. Só não concordo com elas em hipótese alguma. O Felipe certamente é advogado (lá vou eu com meus preconceitos natos) e encara o casamento como uma instituição. Em seu texto, falta muito pouco para que ele diga que adultério deveria voltar a ser crime. A Denise, segundo minha fértil imaginação, foi vitimada por uma criação dicotômica, tanto que ela pensa que o ‘teste drive’ consiste em, nada mais, nada menos, que uma relação de uso e desuso, apego e desapego, desejo e objeto. Com o fim do desejo, o respeito se exala, ad literam.
  Eu não quero me pronunciar longamente sobre. Até porque o post já está pela hora da morte. Todavia, como esta página é um Blog, devo dizer que, em síntese, casamento é o relacionamento no qual se entregam duas pessoas como partes de um todo, dedicando amor, fidelidade e respeito. A meu ver, transcende fidelidade, requer muita lealdade. Não importa se se assumem como solteiros no Rio de Janeiro, casados, namorados, em relacionamento aberto, desde que, no íntimo do casal, eles se encontrem casados. No sentido mais belo da coisa.
  Depois de muito falar, vou terminando por aqui. Ufa, cansei! Mas eu precisava. Só posso dizer que é relevante atentar para o conservadorismo na modernidade para que opiniões diversas não se tornem postulados de preconceito em todas as esferas, política, comportamental, relacional, diplomática. E que, por mais que as coisas mudem, e elas mudam tudo se faz em processo lento, rastejante e regrado. Na mais ligeira invariabilidade profunda mattosiana.

Nota mental: quero namorar, noivar e casar! rsrs

Gracias!

sábado, 28 de agosto de 2010

Para começo de conversa...


  A idéia de criar um Blog já vem de algum tempo, mas a necessidade surgiu agora a pouco. Casualmente, brotou.
  Não sei se essa vontade de escrever em um Blog é um subterfúgio para falar de mim. Eu que sempre achei os Blogs uma versão nada gloriosa dos diários do passado. Aliás, não há semelhança entre as duas coisas.
  A cabeça tem andado cheia de pensamentos, que eu queria – queria muito – que se tornassem idéias. O fato é que eu sou uma mulher (eu já sou uma?) de muitíssimos pensamentos, desordenados e frágeis, mas de raras execuções. Acho que as melhores atitudes que tomo vem do nada.
  Eu não pretendo ser aqui literária, Cult, complexa, original, criativa... Nem esboçar qualquer uma das características que dão emprego hoje.  Escrevo porque se acometeu sobre mim uma vontade, sem ser boa ou ruim, sem me dar nem tirar um pêlo do corpo.
  O medo da solidão tem grande imperativo sobre mim. É por esse motivo que eu procuro a presença externa o tempo todo. Até quando estou só, lendo ou estudando, fico ansiosa. Então faço o incompreensível: ligo o ventilador. É engraçado, mas eu sinto a companhia vibrante das suas hélices, o vento me afaga.
  Por andar sempre tão acompanhada do mundo, ainda que superficialmente, quando eu me vejo sozinha comigo mesma, encarno um arrepio. Seria assim um momento para acertar contas, a hora de refletir sobre os erros. A minha própria presença me assusta. Eu estou ali, viva, cercada por um mundaréu de pensamentos que, sem querer, eu sinto urgência em organizar.
  A minha racionalidade é grande demais. Nos piores momentos, eu analiso por que não fico louca. A única resposta é a vida no limiar da loucura. A diferença é perceber ou não. E, confesso, eu morro de inveja dos que não sabem.
  Vou terminando por aqui este texto longo e enfadonho que, provavelmente, duas ou três pessoas irão ler. Até porque a única coisa que eu tenho certeza de que não sou é popular. Pelo menos uma certeza. rs
  Tentei fazer deste primeiro escrito alguma coisa parecida com um diário. Espero tê-lo conseguido. Falei pelos cotovelos para dizer que sou instável, de muita sensibilidade e pouca imaginação.
  Gracias!